01 abril 2006

320) Um exchange sobre o destino da humanidade, e o papel da América Latina nessa conversa toda (2)...

(continuação do post anterior...)

ES: “O destino da América Latina, de alguma maneira, está sendo jogado no Brasil”, afirmou ele. “O retorno da dupla PSDB/PFL (ao governo federal) significa ter no Brasil um enclave bushista pró-neoliberalismo que os EUA não têm hoje no continente”, disse. E enfatizou: “Temos de ganhar a eleição, impedir que o Brasil se transforme numa quinta coluna do poder norte-americano”.

PRA: Puxa vida!: quanta responsabilidade tem o Brasil nessa empresa. Mas se o Brasil faz quase a metade da América Latina não se trata de apenas um “enclave”, mas de um imenso território perdido para o novo modelo de integração, que então se tornaria impossível e seria provavelmente revertido para o modelo do livre-comércio e da Alca. E se por acaso o sucessor de Bush for um oponente democrata, em 2008, então teriamos um democrata neoliberal como aliado deste “enclave” pró-Bush aqui no Brasil? A dupla PSDB/PFL faria a resistência ao novo poder em Washington? Sinceramente, acho essa visão tão simplista que não honra o alegado descortínio político do professor.

ES: Sader lembrou que o fim o mundo “bipolar” nos anos 90 – após a queda do Muro de Berlim – significou a vitória do campo capitalista e provocou regressões nas ações e no discurso na esquerda, a começar pelo objeto principal de embate. “Antes, lutávamos contra o capitalismo. Agora, lutamos contra o neoliberalismo, que é um modelo de capitalismo”, argumentou.

PRA: Apenas querendo entender, novamente: se o capitalismo ganhou, segundo sua própria versão do “fim da história, do socialismo, ele pretende reverter o processo histórico, lutando contra esse novo modelo de capitalismo para chegar onde, exatamente? No velho socialismo enterrado sob os escombros do muro do Berlim? Se a esquerda regrediu, perdendo o que ele chama de “objeto principal de embate” – que é, obviamente, o socialismo, única força opositora do velho capitalismo de guerra – como é que ele pretende que se retome o velho caminho? Trata-se de um combate de retaguarda ou de uma luta reacionária, ou seja, pretendendo retroceder a épocas passadas da humanidade?

ES: De acordo com o professor, além de predominar em toda parte a “versão liberal” do que seja democracia, hegemonizou-se também o estilo de ser capitalista. “A força dos EUA reside muito mais hoje no campo ideológico, na forma mercantil de vida, no estilo de consumo, na marcas, nas corporações. Tudo isso tem grande poder de sedução, inclusive nas camadas mais pobres da população”, disse.

PRA: Sempre querendo entender: o professor pretende uma “versão não-liberal” da democracia, o que se presume seja uma uma modalidade não-liberal, autoritária, totalitária, ou o quê, exatamente? Registro apenas a contradição nos termos. Se ele não consegue definir a sua modalidade de democracia de modo positivo, só podemos presumir algo negativo: uma democracia “não-liberal”, e ficamos com isso. Quanto ao modo mercantil, mais presente na ideologia do que não se sabe bem onde, trata-se, pelo exposto, de um “estilo de ser capitalista”. Se as camadas populares se deixam seduzir, quais seriam as receitas para reverter esse “estilo”: pregar o estilo cubano, venezuelano?

ES: Para Sader, cabem aos movimentos de esquerda e progressistas o debate sobre novas meios de convivência, entre elas a “construção de forças solidárias e humanistas que não sigam o modelo capitalista, que sejam anticapitalistas”.

PRA: Perfeitamente possível, e não apenas possível, como já está em prática há muito tempo. Ao que eu saiba, as forças de esquerda sempre foram anti-capitalistas e não vejo onde está o apelo à novidade.

(continua no próximo post...)