01 abril 2006

321) Um exchange sobre o destino da humanidade, e o papel da América Latina nessa conversa toda (3)...

(continuação do post anterior...)

ES: Nesse sentido, ele acredita que o atual quadro político latino-americano reúne as bases para determinação de um novo modelo. “A América Latina é um único lugar do mundo cujo projeto de integração regional tem relativa autonomia dos EUA. Aqui, os EUA estão muito mais isolados”, afirmou.

PRA: Fazendo as contas: os EUA firmaram um acordo dito Nafta em 1993, envolvendo o México, depois adotaram uma “iniciativa para o Caribe” e continuaram a negociar bilateralmente e plurilateralmente. No período recente foram concluídos acordos com o Chile, com a América Central e a República Dominicana, com o Peru e com a Colômbia. Estão em curso negociações com o Equador e, talvez, a Bolívia se interesse também, assim como nossos vizinhos e membros do Mercosul, o Uruguai e o Paraguai, já se declararam dispostos ao mesmo tresloucado gesto. Anteriormente, até a Argentina tinha inclinações nesse sentido, processo revertido com a nova administração Kirshner. A Venezuela, oficialmente desde a assunção de Chávez, se declara virulentamente contra a Alca, o que não demoveu os EUA de continuarem a tecer uma rede de acordos bilaterais e plurilaterais na região. Aparentemente, só restam os dois últimos países e o Brasil que se opõem ao projeto imperial. O que sobrou, então? Por certo, as economias do Brasil, da Argentina e da Venezuela respondem por boa parte do PIB sul-americano, mas falar de América Latina nesse contexto pode parecer exagero.

ES: Sader lembrou que o Continente foi a zona predominante dos experimentos e da disseminação do neoliberalismo nos anos 90. Ele citou a maneira como a eleição de Fernando Henrique Cardoso para a presidência do Brasil, em 1994, foi construída “de fora para dentro” – a exemplo do que aconteceu em outros países da região.

PRA: Certo, mas então esses experimentos falharam rotundamente. Com exceção do Chile, quais países, exatamente, podem ser chamados, hoje, de neoliberais? Quanto À eleição de FHC, em 1994, ser construída de “fora para dentro”, trata-se de uma afirmação pelo menos estranha, na medida em que o FMI não confiava, e até se opunha, ao Plano Real. Ao que se sabe, foi esse o plano de estabilização que elegeu FHC, mais do que qualquer apoio externo, que não se sabe bem de onde poderia ter vindo.

ES: Mas foi também na América Latina, ressalvou Sader, que ocorreram as primeiras grandes crises do neoliberalismo, com a quebra das economias do México, do Brasil e da Argentina. “Além do primeiro grito contra o modelo, dos zapatistas, que levou à formação do Fórum Social Mundial”, completou.

PRA: Essas grandes crises foram, obviamente, as crises financeiras de meados e da segunda metade dos anos 90 e do início de 2000, para a Argentina e o Brasil, mas não se pode dizer que o México e o Brasil romperam com o neoliberalismo, para usar essa terminologia mais do que desgastada. Em todo caso, seria interessante que o professor, assim como os aliados do FSM, nos apresentassem, exatamente, os projetos e programas para uma alternativa não-neoliberal de desenvolvimento (capitalista?). OS zapatistas têm a chave da resposta? Seria preciso explicitar quais as bases do novo modelo. Por outro lado, a América Latina, devido ao seu baixo crescimento, baixa produtividade – o que significa, também, baixo dinamismo econômico – e reduzido grau de competitividade econômica, vem perdendo consistentemente posições e espaço no comércio internacional. Como é que ela poderia, nessas condições, liderar qualquer tipo de movimento contra o neoliberalismo? Com a palavra o professor…

ES: A chegada ao poder de governantes de esquerda ou progressistas em vários países (Brasil, Argentina, Uruguai, Venezuela, Chile e Bolívia, principalmente), na avaliação de Sader, levou a avanços importantes, como o fracasso da instalação da Alca (Área de Livre Comércio das Américas), que estava prevista para janeiro de 2005.

PRA: A Alca já tinha fracassado muito antes da eleição dos novos presidentes do Uruguai, da Bolívai e do Chile – um país que, de resto, continua governado por um(a) socialista – e apresentar um fracasso como um “avanço” representa uma contradição nos termos: no máximo se pode dizer que esses “governantes de esquerda ou progressistas” lutaram pela preservação do status quo, pois é isto o que representa a não-Alca: tudo fica como antes… e nada muda. Se isso é um “avanço importante”, então o imobilismo foi elevado à condição de alavanca da história.

(continua no quarto e último post desta série...)